segunda-feira

O vedor, quem veria todas as nuances e vivesse simultaneamente todos os platôs de intensidade, não desprezaria, caso estivesse dentro de um transporte coletivo ou numa praça de alimentação dalguma feira popular, a velha e sua fala de notícias da Martinha, que é uma santa e vai para o céu, garantia, e o vedor o viu e deu fé, coitada da Martinha, dizia a velha, vinte e sete anos cuidando do marido bêbado, depois que esse passa, tomba-lhe a mãe doente, o filho não conheceu, teve que dizer, sou o filho da Martinha, não pode esse tamanho, é um homem, me contou que levou uma facada, Jesus protege, não morreu, tá forte, agora, a mãe da Martinha, essa ta com a pele em cima do osso, coitada da Martinha, ela é uma santa. Vedor assim, o simultâneo, se derrete nas coisas e não lhe resta nada, absorto em tudo.
Ele, vedor de si, viu o caos indistinto que se tornaria sendo quem era e refez seus olhos castanhos. Foram olhos reflexivos inventados, uns tais que representavam com graça e ironia aquele que olhava aos olhos dele. Embora retirasse reações de alguns de gênio sensível, era perfeitamente humano com olhos castanhos reflexivos.
Houve que a mulher notou quem era, não desfez opinião. Que era, dizia, pra não sobrar dúvida na dobra mais escura da alma. A mulher chamava nome de artista, seus cabelos de um outro artista, tinha umas mãos de artista, e de um outro artista tinha os ouvidos, e ia tendo cada coisa de um artista, sendo que por isso era capaz em muitas artes, e fazia bordados, tecia, mas os olhos não, os olhos herdade néfilim, explica o caso perfeitamente, pois os olhos do altíssimo mirou os olhos castanhos reflexivos e o que viu foi anjo, céu de treze cores, pena raiada na testa, rubi pulsante de seu peito, o homem mais lindo era de não ser da terra, a mulher viu.
Mas era ele querer se disfarçar na terra, a mulher encontrava. Disse que não era, que era gente ordinária, que bebia e que fumava, que era um punheteiro, que era bicha, que comia animais em estado podre, mas a mulher não cria, a mulher insistia, dizia saber que era ele, chegou e falou eu vi pena raiada na testa da tua beleza num céu de treze cores. Vedor não queria saber, correu de planeta em planeta até achar uma gruta num esferóide inter-galactical de uma corzinha verde. Não teve modos, mulher achou. Mulher disse que não fazia conta se era gente ordinária, que sendo assim lhe faria uns carinhos, que tinha o conforto da terra no meio das pernas, que ele ia descansar nela como se ela fosse praia. Ele inclinou um pouco a cabeça. A mulher se enrodilhou dizendo que se fosse alma de pena raiada do céu de treze cores se renderia votante por treze bilhões de éons para cada cor das luzes que compõe sua pena raiada de infinitas cores. E se for os dois, perguntou só com a cabeça pra fora do esferóide glauco o vedor. Que assim era brinquedo melhor, que era folguedo na rede a tarde inteira, e de noite era igual, e de manhã não parava, diz que ia ser riso e risada, que se fosse gente tendo pena raiada então fazia delícia no mundo ver que assim existia, que o vedor ia dormir na mulher pra sempre, que inventava uma fonte perpétua de gozo, e que molhava o vedor todo sem fim.
Vedor disse sim, e eles viraram índios, numa terra com muito peixe, água, paca, mandioca.

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