segunda-feira

rubro Aton no ocidente
a foggy day por billie holiday
andorinhões gritando metal
tabaco até vomitar & sonhar
co´as mamas altas da menina
correndo sorrindo música
& fumaça

sexta-feira

new york, paris, sevilla, lima, gibraltar
contanto que peregrino
eu aceito o meu destino

quinta-feira

teonanacatl

tornar-se fêmeo
devir mulher até não só mulher
mas matriz micrônica fixa roxo-negra
de delírio, sonho & vastidão

sexta-feira

em minha próxima vida serei adonis
atingirei a iluminação aos dezessete
fornicarei com as cem esposas
& os vinte sete eunucos da corte celestial
serei o corpo de explendor de diamante
do amor
e todos que me virem
ou sentirem o meu cheiro
despertarão na Terra Pura do Deleite da Alegria
e aqueles para quem eu sorrir
entrarão em transe
entrarão em meu coração
compreenderão a indistinção dos seres
porque aqueles para quem eu sorrir
indistinguir-se-ão de mim
ardentes em meu coração

domingo

eu vi a noite nascer dos cabelos dela e escorrer feito água sobre a terra e os corredores infinitos, tintos & negros, como o vinho português dos meus delírios (outrora esquecidos) por Camila

e outra vez eu me perdi nos descaminhos (corredores, corredores como em Kafka)

como as prisões que são melhores que a santidade ou carcereiros mais libertadores que os piedosos chupadores padres

não posso falhar no meu amor

ou sonhar com o toque

ou pressentir o cheiro

(o cheiro de Camila, mais negro do que doce)

mas não posso querer morder a pera ou beber do vinho

a carne branca está vetada (por meu narcisismo, Camila?)

mas por teu olhar me faço humilde & manso & servil um instante antes de tornar-me um bicho de três patas, nenhuma mente

& lustroso membro

sexta-feira

de como Nut, deusa arco-celeste, está envolvida em secreta prática e de qual sua finalidade ou de como o cosmo é um exercício de auto-cuidado

quando assisti à autofelação de Lucas
nenhuma baixeza estava presente
não era engraçado nem era grosseiro
não era violento nem tinha malícia

quando assisti à autofelação de Lucas
vi delicadeza & gentileza
o rosto roçou suavemente a própria glande
o nariz tocou-lhe o membro vagarosamente
e só então se abriu a boca imensa
                                           imensa como seu vergão
(a boca de Lucas, a negra e arqueada noite)

quando assisti à autofelação de Lucas
algo ocorreu dentro de mim para além da excitação

                   era o novo outra vez

não uma ruptura, mas uma dobra que se estende
a compreensão que Horus deus no Egito conheceu:

Lucas alegrava as estrelas
& alimentava-as

quinta-feira

quero que o girassol invada os prédios os apartamentos os automóveis as sub-prefeituras o departamento de água e esgoto a companhia de telégrafos S.A desde o século XIX o navio cargueiro o central park o shoping center iguatemi a fábrica de concreto a confraria reacionária unidos-em-série o éter a GlaxoSmithKline a polícia militar paulista

& o seu coração

in extremis

possamos nós sermos felizes
ainda que nos falte artérias
mesmo que não tenhamos rins

segunda-feira

quando descobri victor heringer

quando ouvi a voz de victor recitando (para mim) do outro lado do fone de ouvido
desejei que esse bandeira
esse poeta-cronista de voz artística
recitasse mais de perto, ao pé do ouvido,
umas besteiras
e fiz uns votos, uns rezos

          impecáveis senhores do karma,
          ó meu bom jesus,
          nossa senhora da boa foda,
          possa esse poeta ser bonito
          queira deus que seja gay!

vesti-me então de esperas
engendrando nestas letras
a delicadeza de um encontro
algum constrangimento e uns risos

quarta-feira

porque vi um profeta no poeta

por estares inscrito nas numeridades
isso que sentes quando choras
é memória

por seres um de nós
por teres estado lá
por teres visto o que vimos
(martíros, deleites)
porque ou amas ou morres
é que choras memórias

por teres sido chamado pelo nome
porque deves ser santo
mesmo quando estás de quatro e expões a flor do teu segredo
porque sabes disso
porque não esqueces
porque cantas profecias quando te embriagas
porque todos sabem
porque todos vêem
e os ateus te olham com desconfiança
porque teus amigos te chamam de pomba
por ser     (miserere miserere nobis)     inaceitável  a leveza desse fardo
é que choras tuas memórias
chuva de alegria:
crianças gritando
correndo das águas

quinta-feira

deixar que a flor mais pura manifeste seu propósito
cultivar um campo de ternura
deitar-se nu com seu amigo
descobrir estrelas em suas pintas
ensinar que aquelas que o adornam
                      são o cruzeiro do sul
sentir seu cheiro & gostar do cheiro
reparar no som que a pele à beira do silêncio contra a pele faz
dar chance ao silêncio e sorrir
eroticamente & liberto da primazia genital

primeiro canto desesperado de amor a Deus

devo ser louco ou ser mulher
para te amar assim
ou outra coisa absurda
ultra-violeta
sim, devo ser mulher
signo de terra
submissa mais que os anjos
os santos
os fatalistas
tenho mesmo que ter útero
para te amar assim
que não te alcanço nem os joelhos
mas me deleito na simples idéia
, Deus, de teus artelhos

terça-feira

Wu Wei

.
ocupado com as dez mil coisas
sobre o trono de esterco e palha
mestre Lao faz nada

..
desocupado de céu e terra
munindo vasoura e riso
mestre Lao varre o ócio

...
pés, tronco, mãos exatos,
arqueado & delicado & firme,
dançando, mestre Lao descansa

sábado

Sambhogakaya

a palavra: hóspede da realidade
mais recente que do vento
a areia é cliente

a palavra: som escuro
e rouco como as coisas que não tem depois

a palavra: iridescência
impermanente & vazia

                                  pronunciada, entanto,
                                  (performática)
                                  mãe de dez mil coisas em cada um
                                  dos dez mil mundos

a palavra (útero) pare a realidade
                                    a realidade: o corpo de desfrute da vacuidade

terça-feira

flor da montanha

o bihkkhu vestido de açafrão

longos olhos semicerrados nevados ovalados sonhados por mais existências humanas que as areias do grande Ganges

o corpo quase roliço forte firme tônico de juventude e moreno

castanho ocre indígena vermelho mais hopi que um hopi de cidade mais veloz que o appaloosa das planícies

o bihkkhu suave belo desejável como a brisa no verão a pêra o sonho encantado das encarnações beatíficas a moça de cachos dourados coxas ardentes paulinho o trombadinha

sob o manto açafrão lustrosa aromosa sandalizada resguardada e pronta a oferta insuspeitável

o inesperado crescido em minha mão

flor da montanha

rígido vergão jovem & santo

eu aceito teus votos

nenhuma culpa

suprema boa fortuna:

o sexo vazio pelos três kayas

domingo

uma coisa pra dizer
são francisco é perto do espírito
santo encontro nem seria milagre
mesmo por graça teus olhos lembrar
deles num momento de véspera é sinal
ter a cor e desejar o cheiro
do corpo santo do espírito
0
não é hora de escrever um poema
escrevê-lo seria fórceps
metal contra o feto
luar de meio-dia
aracuãs aos bandos gritando a claridade quando no céu encobre o veludo negro (a pele da mãe arqueada)
1
propósitos insossos escorrendo nas paredes dos cafés da lagoa da conceição
caio fernando abreu nas mãos, hilda hilst na cabeça
uma transa incompleta com o rapaz da cidade da palhoça
sessões de sadismo & delicadesa com o ente da pele alva
um sol de sete brilhos refletido nas águas dela
18 anos, olhar do estrelado, asas nos pés, trombeta na mão:
uma lista anuncia meu fim

quinta-feira

domingo

quando a pomba explodiu na sua cara
beatificou-se
em silêncio interior profundo
quedou-se mudo por meia hora
enquanto o outro
no ofício de ser macho
derramado
a exemplo de Jeová nosso pai
chafurdou-se no sono do ócio do sétimo dia

terça-feira

plantar um girassol em ouro preto

vou te dar de presente a surpresa do meu rosto súbito como o beija-flor no centro de minas gerais ou o amor

e não vou nem querer explicar ou conhecer só entregar um beijo molhado de marés e imaginações de quebrar padrões de criar caso com namorados flertes & afins e vou chegar sem avisar mais subitâneo que um aneurisma cerebral

vou beijar

não me importa se você vai estar de mãos dadas de cara limpa ou chapada agudo & crente como São João da Cruz ou obtuso materialista feito um burguês ensebado vou começar por seus olhos e só terminarei quando as estrelas descerem enciumadas do carretel celestial

vou começar por seus olhos e estudar cada pelo da epiderme castanha

vou descansar ao seu lado ficar em silêncio e será confortável estar em silêncio ao seu lado no deserto da noite e quando o silêncio for mais certo que uma aranha do sonhar e tiver criado pele & patas ser espesso como meu próprio sêmen ousarei rompê-lo

para ti sob as estrelas diante do fogo dos nossos corações vou cantar as canções de poder que em jornadas xamânicas destrinchei meus melhores cantos meus gemidos para o grande espírito meus gemidos para o teu espírito teus gemidos para o nosso espírito nossos gemidos para o grande espírito

a onça pintada em carne & espírito nos sondará

haverá um risco de morte & uma bênção de ousadia silêncio alegria

o sol quererá nos ver e o dia virá testemunhar os corpos lambuzados pela eterna verdade
saudade estelar
e a fé absurda, a certeza
de no meu próprio colo descansar

domingo

acaso também aqui é o mar
sob chuva espessa o dia é sem tintas
(trezentos e quarenta e duas tonalidades de chumbo por metro quadrado)
é pesado o cargueiro que atraca
Gearbulk trinta e seis mil toneladas
o menino vestido de borracha é bem leve
Samantabhadra em meu peito é azul imaterial & constante
a pele do médico de orelha decepada olorífica memória
um palmo acima sobre minha cabeça Amitabha vermelho se expande
não se limita às peles que toco
aos cargueiros
às trezentas tintas do chumbo
aos meninos de borracha
a Samantabhadra
à minha cabeça, luz ilimitada

quarta-feira

giravez, outro sol

eu sou um girassol

você é um girassol absurdo

inconveniente amarelo heliotrópico miraluzente

eu, você, um girassol

nós somos um girassol de Ginsberg no fim da tarde à beira da locomotiva cinza

eu, você

nós somos o girassol de verdade

amarelo

tudo mais é mentira

terça-feira

satori

súbito eclode
de uma barata
um Buddha

domingo

a verdade é amarela tudo mais furta-cor

houve que o dia raiou amarelo
e aquela certeza simples da potência dos corpos
o girassol é amarelo tudo mais é mentira
eu não sou mentira sou girassol
Nós não somos nossa pele de sujeira, nós não somos nossa horrorosa locomotiva sem imagem empoeirada e arrebentada, por dentro somos todos girassóis maravilhosos, nós somos abençoados por nosso próprio sêmem & dourados corpos peludos e nus da realização crescendo dentro dos loucos girassóis negros e formais ao pôr do sol, espreitados por nossos olhos à sombra da louca locomotiva do cais na visão do poente de latarias e colinas de Frisco sentados ao anoitecer. (Ginsberg&Willer)
dois goles - apenas dois goles - de sofrimento me trouxeram a grande alegria
porque sabia dos amores tintos
da rubrescência das mucosas esfoladas por muito amor
dos salões perfumados de Santa Maria
do girassol da verdade

dois corpos amei sem tocar
entre tantos que toquei sem amar
o monstro terra & o girassol
(as pernas peludas de Jesus)
todos magros e morenos
o girassaol é amarelo a terra é vermelha no planeta azul
                                  eu te amo
isso é verdade

sábado

depois do dilúvio

quem sou eu na noite perdido

o altivo sublunar tarado?

o horizonte despeja relânpagos sobre o mar negro

Iansã ri de mim

Iemanjá chora por mim

vagabundo ardente cego louco de desejo

tenho vontade de odiar Vinícius

me lembro do elástico Bruno da cidade de Santos

me lembro do intocado delgado moreno Bruno do Espírito Santo

me lembro do perfume do perfeito garoto do carro vermelho

sinto dores nos braços

na cabeça um cabaço rompido constantemente

Krisna sorri docemente para mim em perdição

o rapaz de longas tranças no queixo me pede um cigarro que não tenho

me manda tomar no cu

digo amém Jesus, no one curse who Jah bless

o ras sorri e pedala sumindo na boca preta da noite grande

a cidade está lavada, ainda há pontos de alagamento

um casal copula num banco da Praia Grande de São Francisco do Sul do norte do estado de Santa Catarina

eu sorrio enquanto o rapaz negro tenta ocultar num amplexo a nudez branca da mulher que o recebe

a beleza simplória do amor deles ameniza completamente minhas maldições à heterossexualidade

no one curse who Jah bless, man

um gambá expõe seu rabo bicolor em meu telhado

depois do dilúvio sinto sede de companhia

não tenho pena de ninguém e estou completamente compadecido de todos & todos em mim

terça-feira

depois da alegria

aquele era bonito como um pássaro impertigado
uma maçã muito rubra milagrosamente sem bichos nem agrotóxicos
um laço de impecável cetim no corpo da grande árvore dos assentamentos de Iroko
uma gazela
um leão aquele era

aquela rapaz: uma flor mimosa num terreno hostil
contra-vento, escarpada na rocha,
uma flor mimosa de Oxalá

e no entanto
esperdiçada a potência do encontro
agora é só dor no ânus